
No Brasil, sendo o aborto ilegal numa situação como está, a tendência, com a chegada até nós desse tipo de exame, é o aumento do aborto ilegal. A ciência vive pressionando a ética: trata-se aqui da ampliação do poder de escolha informada. Aumentando os recursos técnicos da medicina pré-natal, aumenta-se proporcionalmente a possibilidade de se evitar determinados tipos de gravidez. O nome disso, segundo o filósofo americano Francis Fukuyama, é "design babies" (bebês de prancheta, na tradução brasileira): bebês ao portador, com grau máximo de saúde. Católicos dirão que a vida pertence a Deus. Quem não crê nisso tem diante de si a seguinte questão: por que devo me submeter ao mero acaso? Afinal, a criança não foi fruto de um orgasmo (masculino, no mínimo)? Se o acaso decidiu qual óvulo e espermatozoide que estariam a postos, por que devo eu me submeter a tamanho capricho cego?

O processo de ampliação de escolha informada implica, num prazo de tempo não muito preciso, a crescente artificialização da atividade reprodutiva humana. Isso é tão inevitável como a ampliação dos direitos civis, tais como voto das mulheres, casamentos gays, direitos da mulher sobre seu corpo, e afins. Se você vê um dia um homem aparentando 60 anos, mas com corpo e disposição de 40, correndo no Ibirapuera ao lado de uma gostosa de 25, você talvez não imagine quantos remédios ele tomou quando acordou, entre eles, um Viagra. Isto é a artificialização da vida. Dito assim, parece um absurdo do cinema de ficção científica, mas na prática, é banal como tomar vitaminas e vacinas. Num futuro próximo, ter filhos pelo método do acaso será como negar vacinas aos filhos. Um ato de irresponsabilidade reprodutiva. Empresas de seguro cobrarão mais caro por apólices de crianças geradas pelo relojoeiro cego. Ou simplesmente recusarão estas apólices. ONGs farão campanhas para criminalização da reprodução não assistida pela medicina pré-natal genética em nome da sustentabilidade social das crianças geradas e dos custos de saúde pública. Vejo mesmo o comercial: "Dê a seu filho o que você tem de melhor, Bradesco Biotecnologia".
Por Luiz Felipe Pondé - Folha de SP - 04/02/2013
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