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O objetivo deste blog é discutir idéias, expor pontos de vista. Perguntar mais do que responder, expressar mais do que reprimir, juntar mais do que espalhar. Se não conseguir contribuir, pelo menos provocar.

quarta-feira, 28 de novembro de 2012

STRESS DIGITAL

Querido leitor, que você esteja bem. Costumo dizer que o stress se manifesta geralmente nas pessoas indecisas.

Claro que minha afirmação não é científica, é mais empírica do que outra coisa, porém, sempre me estresso mais quando não consigo decidir ou a decisão não depende de mim ou só de mim.
Mas não é só por isso que às vezes me estresso. Tem uma outra modalidade que vem assolando a todos, que é o stress digital, que vem por intermédio da armadilha da digitalização.

Veja você que o ser humano inventou o telefone fixo, o telefone celular, o computador, os notebooks, a internet, o iPod, enfim, uma infinidade de facilidades eletrônicas. Tudo isso para termos mais tempo para descansar, filosofar com amigos, curtir a família, pescar, ler livros, assistir filmes, isto é, levar uma vida melhor. Mas é isso que está acontecendo conosco? Parece que não, acabamos vítimas das algemas destas inovações digitais.

Esses equipamentos, criados para agilizar nosso trabalho, acabaram permitindo que sejamos localizados e sufocados 24 horas por dia pelo colega, pelo “patrão”, pelos clientes que a cada dia estão mais exigentes. Ou, inverso disso, que localizemos e sufoquemos outros profissionais.

Parece-me que estamos presos pela rede digital, cuja prisão nós mesmo criamos e permitimos que fosse usada. Provavelmente tornamo-nos todos escravos digitais e essa é talvez a principal razão por que o mundo vive tão estressado.

Quem de vocês não recebeu uma ligação de um cliente, colega, diretor ou até parente cobrando ou encaminhando alguns assuntos durante a noite ou no final de semana? E fico mais preocupado com o número de telefonemas que nossos adolescentes enviam e recebem durante o dia, permitindo uma invasão de estranhos bate-papos em horas impróprias como na hora das refeições familiares e até durante as aulas.
 
Meus pais não me advertiram sobre esse assunto porque não conheciam e não conhecem a era digital, mas nós precisamos interferir na educação de nossas crianças ou, pelo menos, prestar atenção aos nossos filhos.

Se não o fizermos, seremos coniventes com jovens e adultos estressados e mal-humorados de amanhã. O mundo digital foi criado para nos libertar, não para nos aprisionar.

É assim como o mundo me parece hoje. E você, o que pensa sobre o stress digital?
 
 
Por Beto Colombo
Artigo veiculado na Rádio Som Maior FM no dia 21/11/2012 e no Jornal A Tribuna no dia 22/11/2012.

terça-feira, 20 de novembro de 2012

ANTES DE MORRER, VIVA!

Olá...     Este artigo de autoria de um colega de caminhada na filosofia clínica, Dr. Ildo Meyer, garimpei do ótimo blog do Aloysio http://aloysiot.blogspot.com.br/ . Os textos do Ildo, em especial este, nos fazem pensar a respeito das coisas simples e verdadeiramente essenciais na vida sob a visão de um médico anestesista. Posso dizer quem sabe, que este doutor e filósofo têm "know how" sobre o assunto, quando dos corredores das clínicas e hospitais vivencia de perto o cotidiando de viver e deixar de viver, que por vezes pode não ter nada haver com a morte em si.
 
Paz e virtude amigos!
 
André Topanotti


Por Ildo Meyer:

Atenção! Este artigo pode ser lido por pessoas de todas as idades, mas dependendo da faixa etária, despertará interesses diversos e quem sabe até, antagônicos. Jovens não têm idéia e nem imaginam como será sua velhice, muito menos a morte. Já os velhos, mais sábios e experientes, convivem com a proximidade da morte mais realisticamente. Embora possa parecer paradoxal, este artigo é dedicado a todos aqueles que não querem envelhecer. Jovens, meia-idade e idosos, leiam enquanto é tempo.

Um dos grandes sonhos da humanidade é a descoberta da fonte da juventude. Fortunas e vidas foram e continuam sendo gastas nesta procura. Milhões de pessoas foram enganadas com promessas de retardar, parar ou reverter o envelhecimento e a ilusão da vida eterna.

Nas bases científicas atuais, imortalidade ainda é uma impossibilidade. Mesmo eliminando todas as causas de morte relacionadas ao envelhecimento que aparecem nos atestados de óbito, ainda assim ocorreriam acidentes, homicídios, suicídios e os processos biológicos de envelhecimento continuariam realizando suas funções.

Se não morrer é impossível, não envelhecer também o é. Não acredite nas mídias antienvelhecimento, pois são tão utópicas quanto permanecer jovem congelando em um freezer ou realizando um pacto com o diabo.

Diante deste cenário, não existe outra saída, a única forma que se descobriu de viver muito tempo é envelhecer, e ficar velho, na verdadeira acepção da palavra, é uma questão de tempo. Literalmente.

A expectativa de vida para recém nascidos hoje nos Estados Unidos (país com condições de prover um bom atendimento em saúde) é de 77 anos. No inicio do século XX era de 47 anos. Este acréscimo de 30 anos não se deve a alterações morfológicas nos indivíduos que agora estão aptos a viver mais tempo e sim ao ambiente protegido em que vivemos e aos avanços na medicina que permitiram diagnosticar e tratar doenças de maneira precoce e eficaz. Continuamos a envelhecer da mesma maneira que nossos antepassados, a medicina é que evoluiu.


Intervenções cirúrgicas, cosméticos, vitaminas, antioxidantes, hormônios, engenharia genética podem vir a aumentar a expectativa de vida, porém do ponto de vista científico nenhum método provou modificar os efeitos subjacentes ao envelhecimento humano. Em outras palavras, as terapias utilizadas podem maquiar os efeitos da idade, influenciando as manifestações, mas não o processo de envelhecimento. O ser humano foi programado para nascer, crescer, envelhecer e morrer, entretanto, o envelhecimento e a morte não estão programados objetivamente em nossos genes, de tal forma que podemos melhorar o estado fisiológico em qualquer idade se evitarmos comportamentos que acelerem a expressão de doenças relativas ao envelhecimento. (fumo, excesso de bebidas alcoólicas, exposição demasiada ao sol e obesidade).

Estilo de vida saudável, incluindo exercícios, dieta balanceada e sono adequado podem contribuir para aumentar a expectativa e a qualidade de vida na velhice, contudo, não existe evidência científica comprovando que estas praticas aumentem a longevidade por modificações no processo de envelhecimento. Não leve estas afirmativas como desculpa para relaxar os cuidados com seu corpo. Idade é uma coisa, qualidade de vida é outra. Podem andar juntas ou não, esta escolha você pode fazer.

O potencial humano de vida está calculado em 120 anos, porém ainda estamos longe de alcançar esta marca. Se não houver nenhuma descoberta que altere a fragilidade que acompanha o envelhecimento, a expectativa de vida para o século XXI não ultrapassará os 90 anos.

Prestem atenção neste número, noventa anos. Para que desejamos viver mais tempo? Nem sabemos direito o que fazer com esta curta vida que recebemos, por que pensarmos em uma vida eterna? Quanta energia é desperdiçada com a preocupação de esconder os fios de cabelos brancos ou apagar a história escrita em formas de rugas?

Sabemos que é melhor chegar à velhice do que morrer no meio do caminho, mas não queremos chegar tão cedo e negamos que tenhamos chegado. Para que lutar contra o tempo e nos enganarmos? A derrota é certa. Se não é possivel parar o tempo, podemos utilizá-lo a nosso favor. Aproveite, pegue leve, saboreie cada dia. Adicione vida aos anos ao invés de anos à vida, afinal de contas, idade não é um pretexto para envelhecer. Não lamente o fato de estar ficando velho, é um privilégio negado a muitos. Viver é envelhecer, nada mais.

Lembre-se, antes de morrer, viva!
 
 
Por: Ildo Meyer - http://www.ildomeyer.com.br

sexta-feira, 16 de novembro de 2012

O CÉTICO E O LÚCIDO

Já citei em outras oportunidades que o tema "Fé, Religião e Espiritualidade" me provoca muito. É um de meus temas favoritos. Este assunto é para mim como arranhar as unhas em um quadro negro. Não há como me manter quieto. Este texto que meu colega Paulo de Tarso postou em seu blog (http://paulodetarsofc.blogspot.com.br)   retrata um sentimento que tenho sobre o 'transcedente'. Para mim hoje, muito do que as religiões pregam não me fazem mais sentido algum. O que me resta é a forte experiência e percepção de que Algo muito Maior e Verdadeiro está a nos cuidar e reger. Sem méritos religiosos, nosso espírito é como este dois bebês a conversar: Alguns com muitas dúvidas, mas afirmando saber, outro com muitas dúvidas, porém com uma certeza: Ele existe. Qual bebê representa seu pensamento a respeito dEle?
 
Tenha e faça uma ótimo final de semana!
André Topanotti
 
Autor Desconhecido 
 
No ventre de uma mulher grávida estavam dois bebês. O primeiro pergunta ao outro:
- Você acredita na vida após o nascimento?
- Certamente. Algo tem de haver após o nascimento. Talvez estejamos aqui principalmente porque nós precisamos nos preparar para o que seremos mais tarde.
- Bobagem, não há vida após o nascimento. Como verdadeiramente seria essa vida?
- Eu não sei exatamente, mas certamente haverá mais luz do que aqui. Talvez caminhemos com nossos próprios pés e comeremos com a boca.
- Isso é um absurdo! Caminhar é impossível. E comer com a boca? É totalmente ridículo! O cordão umbilical nos alimenta. Eu digo somente uma coisa: A vida após o nascimento está excluída - o cordão umbilical é muito curto.
- Na verdade, certamente há algo. Talvez seja apenas um pouco diferente do que estamos habituados a ter aqui.
- Mas ninguém nunca voltou de lá, depois do nascimento. O parto apenas encerra a vida. E afinal de contas, a vida é nada mais do que a angústia prolongada na escuridão.
- Bem, eu não sei exatamente como será depois do nascimento, mas com certeza veremos a mamãe e ela cuidará de nós.
- Mamãe? Você acredita na mamãe? E onde ela supostamente está?
- Onde? Em tudo à nossa volta! Nela e através dela nós vivemos. Sem ela tudo isso não existiria.
- Eu não acredito! Eu nunca vi nenhuma mamãe, por isso é claro que não existe nenhuma.
- Bem, mas às vezes quando estamos em silêncio, você pode ouvi-la cantando, ou sente, como ela afaga nosso mundo. Saiba, eu penso que só então a vida real nos espera e agora apenas estamos nos preparando para ela.

segunda-feira, 12 de novembro de 2012

O MESTRE, OS FARISEUS E O CONDENADO


Existem dois ditos populares que circulam muito entre "os da fé": 'Não julgue para não ser julgado' e 'Só Deus pode julgar uma pessoa’. Estes provérbios me levam a algumas reflexões. Uma delas seria o motivo por que julgar. O senso cotidiano mostra que um julgamento se faz necessário na medida em que um crime é cometido. Lembro-me daquela passagem bíblica onde o próprio Jesus nos últimos minutos de vida disse a um homem condenado juntamente consigo a morte de cruz, que ele O encontraria ainda naquele dia no paraíso. Jesus falou isto ao homem por conta da sua declaração de fé, o que denotou para Cristo, o sentimento de arrependimento daquele homem. Em contraposição aos pés da Cruz e nas redondezas do Gólgota estavam os religiosos, firmes na convicção de sua fé, que estavam fazendo o que era correto aos olhos de Deus, quando condenaram Cristo a cruz. Será que os Fariseus estavam certos? Estava certo agora o homem crucificado, arrependendo-se ao final da vida? Antes de declarar sua fé em Cristo era aquele homem, de acordo com alguns historiadores, um provável assassino. Seria o arrependimento deste homem o suficiente para reparar os possíveis danos aos familiares das vitimas deste criminoso?

 
Muito podemos questionar sobre nossas atitudes de 'magistrados' do alheio, pois é muito comum tacharmos "o outro" de impuro ou criminoso e o sentenciar usando 'recortes' de nossa sabedoria limitada. Façamos um paralelo contemporâneo e pessoal com esta historia narrada por Lucas no capitulo 23 de seu evangelho: Quantos de nós identificam-se com os personagens dos fariseus? Para mim, este ´papel’ não é nada simpático, porém eles achavam que estavam fazendo algo correto aos seus olhos, providenciando a crucificação de Cristo. Estes eram segundo o livro sagrado dos cristãos, os homens da fé daquela época e lugar. Quantos de nós não agimos assim hoje, e baseado em nossas crenças? Porque acreditamos em algo de uma forma e maneira, e ofuscado por pré-juízos que entendemos ser superior ao do outro, revestimo-nos de uma toga espiritual para julgar o próximo, esquecendo que por trás da vestimenta ornamentada por ritos e atos sagrados jaz um ‘eu’ tão fraco, profano e dubio quanto àquele que é julgado. Fariseu é o outro, eu não! Eu, e provavelmente mais uma legião de almas irmanadas pela promessa de vida após a morte gostaria de estar na mesma condição daquele homem condenado. Ele ouviu do Mestre que o encontraria nos céus ainda naquele dia: E esta é a parte boa da estória. Agora, quem gostaria de ficar com a fama que ele ficou? Mesmo perdoado, a marca de criminoso o acompanhou.


 
Para mim, o mais marcante na narrativa de Lucas é a atitude de Jesus... Um Mestre! Creio que este é um dos motivos que faz a mensagem deste Galileu cruzar os mares e séculos e chegar até os dias atuais: Primeiro perdoa e dá esperança ao condenado declarando: "estarás ainda hoje comigo, no paraíso"; Depois perdoa e intercede por aqueles que até ali o perseguiram: "Pai perdoa-lhes porque não sabem o que fazem." O tom desta oração pode parecer presunçoso, mas se olharmos do ponto de vista do conhecimento dos fariseus, Cristo realmente disse uma verdade: Eles (os fariseus) e qualquer ser humano que julga, o faz sem conhecimento pleno do que está julgando. Algumas pessoas podem conhecer mais, outras menos a respeito de determinadas matérias técnicas, mas em se tratando de pessoas, a exclusividade do indivíduo faz com que as relações se tornem também únicas e complexas. Olhar para o outro e procurar vê-lo como “penso” que sou, e a partir desta medida imprecisa o julgar, é um forte convite ao erro nas relações entre as pessoas. Procurar ver o outro em sua exclusividade e antes de julgar, compreendê-lo, nos fará abrir possibilidades infinitas, tantos quantos forem estes ‘indivíduos’, assim como o Mestre em situação tão adversa procurou compreender a cada um dos que o cercavam. Para mim, vale olhar para o exemplo dEle, sair da condição de ‘condenado’ ou de ‘fariseu’ e agir como um mestre.

 

Por André Topanotti – Criciúma/SC – 12/11/2012.

sexta-feira, 9 de novembro de 2012

PASSEIO SOCRÁTICO

Olá

Faz uns três anos que recebi este artigo por e-mail. Na época achei muito interessante, porém tinha perdido o tal texto. Ontem Juliel Boaventura, uma colega de trabalho de espírito voluntário e preocupada com as coisas 'da alma', me encaminhou uma mensagem, e que prazer ao ver que o texto era o tal artigo do Frei Beto que na época não arquivei. Hoje com um olhar um pouco mais crítico, não concordo 'completamente' com o texto, não pelo carregado viés esquerdista dele, até porque eu acho que o direitismo também não é a solução de todos os males, mas apenas porque não busco mais respostas absolutas para a tal desejada felicidade. Hoje eu acho este terreno um tanto insólito para definirmos regras. O texto é inteligente e nos faz refletir sobre nosso velho e moderno estilo de vida. Os 'atalhos' e 'vices conceitos', como se conceitua na Filosofia Clínica, e que Frei Beto usa no texto são bem criativos além de provocativos. Para mim, vale cada minuto a leitura do artigo.

Façamos um bom final de semana!
 
 
André Topanotti


Por Frei Beto

Ao viajar pelo Oriente, mantive contatos com monges do Tibete, da Mongólia, do Japão e da China. Eram homens serenos, comedidos, recolhidos e em paz nos seus mantos cor de açafrão. Outro dia, eu observava o movimento do aeroporto de São Paulo: a sala de espera cheia de executivos com telefones celulares, preocupados, ansiosos, geralmente comendo mais do que deviam. Com certeza, já haviam tomado café da manhã em casa, mas como a companhia aérea oferecia um outro café, todos comiam vorazmente.

Aquilo me fez refletir: 'Qual dos dois modelos produz felicidade?'

Encontrei Daniela, 10 anos, no elevador, às nove da manhã, e perguntei: 'Não foi à aula?' Ela respondeu: 'Não, tenho aula à tarde'. Comemorei: 'Que bom, então de manhã você pode brincar, dormir até mais tarde'. 'Não', retrucou ela, 'tenho tanta coisa de manhã...' 'Que tanta coisa?', perguntei. 'Aulas de inglês, de balé, de pintura, piscina', e começou a elencar seu programa de garota robotizada. Fiquei pensando: 'Que pena, a Daniela não disse: 'Tenho aula de meditação!

Estamos construindo super-homens e super mulheres, totalmente equipados, mas emocionalmente infantilizados.

Uma progressista cidade do interior de São Paulo tinha, em 1960, seis livrarias e uma academia de ginástica; hoje, tem sessenta academias de ginástica e três livrarias! Não tenho nada contra malhar o corpo, mas me preocupo com a desproporção em relação à malhação do espírito. Acho ótimo, vamos todos morrer esbeltos: 'Como estava o defunto?'. 'Olha, uma maravilha, não tinha uma celulite!' Mas como fica a questão da subjetividade? Da espiritualidade? Da ociosidade amorosa?

Hoje, a palavra é virtualidade. Tudo é virtual. Trancado em seu quarto, em Brasília, um homem pode ter uma amiga íntima em Tóquio, sem nenhuma preocupação de conhecer o seu vizinho de prédio ou de quadra! Tudo é virtual. Somos místicos virtuais, religiosos virtuais, cidadãos virtuais. E somos também eticamente virtuais...

A palavra hoje é 'entretenimento'; domingo, então, é o dia nacional da imbecilização coletiva. Imbecil o apresentador, imbecil quem vai lá e se apresenta no palco, imbecil quem perde a tarde diante da tela. Como a publicidade não consegue vender felicidade, passa a ilusão de que felicidade é o resultado da soma de prazeres: 'Se tomar este refrigerante, vestir este tênis, usar esta camisa, comprar este carro,você chega lá!'

O problema é que, em geral, não se chega! Quem cede desenvolve de tal maneira o desejo, que acaba precisando de um analista. Ou de remédios. Quem resiste, aumenta a neurose. O grande desafio é começar a ver o quanto é bom ser livre de todo esse condicionamento globalizante, neoliberal, consumista. Assim, pode-se viver melhor. Aliás, para uma boa saúde mental três requisitos são indispensáveis: amizades, autoestima, ausência de estresse. Há uma lógica religiosa no consumismo pós-moderno.


 

Na Idade Média, as cidades adquiriam status construindo uma catedral; hoje, no Brasil, constrói-se um shopping-center. É curioso: a maioria dos shoppings-centers tem linhas arquitetônicas de catedrais estilizadas; neles não se pode ir de qualquer maneira, é preciso vestir roupa de missa de domingo. E ali dentro sente-se uma sensação paradisíaca: não há mendigos, crianças de rua, sujeira pelas calçadas. Entra-se naqueles claustros ao som do gregoriano pós-moderno, aquela musiquinha de esperar dentista. Observam-se os vários nichos, todas aquelas capelas com os veneráveis objetos de consumo, acolitados por belas sacerdotisas. Quem pode comprar à vista, sente-se no reino dos céus. Deve-se passar cheque pré-datado, pagar a crédito, entrar no cheque especial, sente-se no purgatório. Mas se não pode comprar, certamente vai se sentir no inferno. Felizmente, terminam todos na eucaristia pós-moderna, irmanados na mesma mesa, com o mesmo suco e o mesmo hambúrguer do Mc Donald...

Costumo advertir os balconistas que me cercam à porta das lojas: 'Estou apenas fazendo um passeio socrático.' Diante de seus olhares espantados, explico: 'Sócrates, filósofo grego, também gostava de descansar a cabeça percorrendo o centro comercial de Atenas. Quando vendedores como vocês o assediavam, ele respondia:.. "Estou apenas observando quanta coisa existe de que não preciso para ser Feliz"!!

Por Frei Beto
Texto Extraído de http://www.freibetto.org/index.php/artigos/41-passeio-socratico-frei-betto

segunda-feira, 5 de novembro de 2012

CADA UM COM SEUS PROBLEMAS

Olá...
 
No mês passado publiquei o texto "Miniatura de Periguete" de Rosely Sayão e para quem gostou, este artigo têm mesmo tema e conteúdo, ótimo para 'pais' que como eu, estão no desafio de deixar filhos melhores para este mundo.
 
Sigamos com coragem nosso Caminho!
 
 
André Topanotti
 
 
 
Por Roseli Sayão
 
Muitos pais, com filhos de todas as idades, perguntam como fazer a criança ou o adolescente assumir suas responsabilidades. Os exemplos são os mais diferentes e a lição de casa --seja a cotidiana, seja o chamado trabalho-- é a grande campeã. A mãe de uma criança de cinco anos conta que já está desesperada porque a filha não quer saber de fazer sua lição de casa nem com ajuda. Ela já colocou a filha de castigo, já a premiou, já conversou, já fez tudo o que sabia, mas não conseguiu resultados. Vários outros pais contam situações semelhantes. A grande pergunta de todos eles é: "O que eu posso fazer para resolver isso de vez?". Lição de casa nessa idade?! Creio não haver mesmo solução.
 

Outros exemplos muito citados são as pequenas tarefas domésticas que os filhos deveriam fazer, mas não fazem. Colocar a roupa suja no local adequado, arrumar a cama, guardar as roupas e os calçados que tiram e espalham pela casa, ajudar a arrumar a mesa para o jantar etc. A criançada não quer saber de trabalho. Muito menos de tarefas. Uma mãe, muito bem-humorada, disse que ela proibiu o filho de dizer a frase "Já vou, mãe". É que sempre que ela cobrava o filho para que fizesse o combinado ela ouvia a tal frase, agora vetada.
 

Por fim, a escola e o resultado das avaliações. Todos os pais que me escreveram disseram que os filhos não gostam de estudar, que não se preocupam com as notas baixas, tampouco com o risco de retenção ou de mudança de escola. Nem as ameaças funcionam, contam os pais. Nem mesmo prêmio em dinheiro, que os mais novos gostam tanto de ter, dá resultado.
 

Vamos encarar o assunto começando pela responsabilidade escolar. Hoje, existem dois fatores que conspiram contra a possibilidade de crianças e adolescentes assumirem a vida escolar como uma batalha pessoal e intransferível: os pais e a própria escola. Os pais decidiram que os filhos precisam, de qualquer maneira, ter uma vida escolar exitosa. Para tanto, procuram a melhor escola, contratam professores particulares, buscam profissionais para ajudar o filho a enfrentar as dificuldades que encontram, estão em contato constante com dirigentes da escola etc.

Já afirmei aqui e repito: parece que a vida escolar do filho se tornou uma espécie de avaliação de seus pais. Bons pais produzem alunos dedicados aos estudos e com bons resultados em qualquer tipo de avaliação. Essa parece ser a máxima em vigor. Ocorre que, enquanto a vida escolar for uma questão vital para os pais, os filhos não a assumirão como sua. A escola, por sua vez, continua a atuar como fazia séculos atrás: espera que os alunos deem conta das tarefas sem que sejam ensinados. 
 
Tomemos a lição de casa como exemplo. Se o aluno não aprender que fazer a lição tem seus frutos e não fazer também, não terá motivo algum para assumir sua lição. O que acontece com o aluno que não entrega a lição? Essa é uma boa pergunta que os pais deveriam fazer para a escola. Aí, quem sabe, poderiam ficar tranquilos deixando a lição de casa, feita ou não, com o filho.
 
 
Quanto às pequenas responsabilidades com os afazeres domésticos é preciso, em primeiro lugar, que a criança sinta que pertence àquele grupo familiar e que isso acarreta ônus e bônus. Até os seis anos, mais ou menos, a criança aprende sempre que os pais lhe pedem para ajudar. Depois disso e até a adolescência, a criança aprende fazendo com a ajuda dos pais. Na adolescência, o filho precisará ser sempre lembrado de suas responsabilidades. Mas não vale fazer por ele, mesmo que isso custe não ter roupa limpa na hora que ele precisar. Ensinar aos filhos que eles devem assumir suas próprias responsabilidades dá trabalho, exige paciência e persistência, porque é uma tarefa que dura mais ou menos uns 18 anos. Com sorte.

 
Por: Rosely Sayão - Folha de SP - 30/10/2012

sexta-feira, 2 de novembro de 2012

FILOSOFIA DE LAVAR LOUÇA

Olá...
 
Para mim, Luiz Felipe Pondé é um dos mais ácidos e também mais lúcidos escritores contemporâneos que temos no Brasil. Seu "jeitão" polêmico, pode passar por grosseria ou estupidez para os desavisados, porém estupidez pode ser a nossa, quando ao ler Pondé, não respirarmos fundo para sentir o cheiro da sinceridade e da mais cristalina verdade que emana das suas crônicas. "Filosofia de Lavar Louça" é uma dessas sensações únicas e reveladoras que só a leitura de Pondé pode nos proporcionar. Para mim, vale a pena ler e "respirar" este texto.
 
Vida eterna aos nossos ancestrais!
 
 
André Topanotti
 
 
 
Por Luiz Felipe Pondé - Folha de São Paulo
 
Fala-se muito de como o "Primeiro Mundo é isso e aquilo". Acho isso papo de vira-lata. Toda vez que você ouvir alguém falando que a Europa "é outra coisa", você está diante de um vira-lata rondando a lata de lixo dos outros. A mesma coisa vale para os EUA, ainda que, nesse caso, vira-latas de esquerda jamais elogiem os EUA, mesmo que comprem iPads lá. Mas independentemente dessa breguice de vira-lata querendo fingir que entende de vinhos, há um detalhe na vida europeia e norte-americana que vale a pena discutir: a vida doméstica e suas tarefas. Mas, sintomaticamente, os vira-latas nunca falam disso, porque a própria condição de vira-lata os impede de entender ou mesmo enxergar esse detalhe. O sonho do vira-lata é fingir que é llhasa apso e por isso acha que ser um llhasa é desfilar bolsa Prada no JK Iguatemi.

 
O Brasil é terra de atrasado, corrupto, esculhambado, inculto, novo rico e por aí vai. Tudo isso é verdade. A prova disso é que aqui luxo é ostentação. Suspeito que grande parte do que há de fato de bom na Europa e nos EUA em termos de hábitos e costumes (portanto, estamos falando de moral) se deve ao fato de que nesses lugares as pessoas se movimentam de modo diferente no cotidiano das suas tarefas.
 

Sempre ouvi os mais velhos dizerem que "o costume de casa vai à praça" e isso é a mais pura verdade. Além de fazerem sexo melhor, suspeito também que os mais velhos entendiam bem melhor do que é essencial, principalmente porque não tinham essa parafernália de ideologia e outros quebrantos bobos como ferramenta de análise do mundo. Eles observavam a vida sem a presunção de ter descoberto a chave do mundo, como nossos contemporâneos viciados em "teorias de gabinete", como dizia Edmund Burke.

Lembro-me bem que minha filha, chegada à França com cerca de dois anos de idade, chorava porque não podia lavar louça como meu filho, seu irmão, mais velho do que ela nove anos. Isso é sintomático de muitos outros pequenos detalhes: para ela, lavar a louça era parte de ser da família. Meu filho, minha mulher e eu partilhávamos todo o cuidado com a vida cotidiana, inclusive o cuidado com a caçulinha.
 

Em países como a França, Alemanha, Israel, EUA e outros semelhantes, você é responsável por tudo que acontece na sua casa. Roupa, comida, limpeza, compras, resolução de pequenos problemas logísticos, enfim, da sustentação da vida. As casas (menos nos EUA, mas ainda assim a ocupação de espaço é diferente da nossa) são menores e mais simples, mesmo que com mais parafernália tecnológica, quando você tem condição de tê-la. O que me chama atenção em relação às casas não é só seu tamanho, mas a ocupação do espaço. No Brasil temos a famosa sala de visita que, se você "está bem de vida", deve ser completamente inútil e parecer desocupada. Por isso, sempre suspeito que manter uma parte da casa sem uso é signo de vira-lata.

As aristocracias antiga e medieval, as únicas verdadeiras, também não tinham castelos sem uso. Burguês, e aristocracia falida, com "castelo" na zona leste ou nos Jardins é coisa de "wannabe", como dizem meus alunos. Goethe, em seu maravilhoso "Os Anos de Aprendizado de Wilhelm Meister", descreve o que é a casa de um burguês: ter mais coisas do que precisa e não ter uma relação de uso e necessidade real com os objetos da casa.

Este é o caso. Uma sala de visitas imaculada faz você parecer rico o bastante para manter parte da sua casa sem uso e, com isso, você trai sua breguice burguesa. Acho que grande parte de nossas agruras vem do fato de que não lavamos louça com frequência e de que temos cômodos dissociados de nosso cotidiano e necessidades. Basílio Magno (século 4) criou a regra da vida monástica: estudar, contemplar, trabalhar. Uma atividade alimenta a outra, e as três formam o espírito. A sabedoria monástica é uma das maiores criações do espírito humano.

Entre nós, dar "tudo" para os filhos até os 40 anos de idade é signo de sermos bons pais. E com isso preparamos adultos retardados e com futuras salas de visita cheias de fantasmas de nossa pobreza de espírito.
 
 
Por Luiz Felipe Pondé - Folha de São Paulo